terça-feira, 31 de agosto de 2010

Bom apetite

Se eu pudesse ou conseguisse expressar um terço do que me domina por dentro ao te ver, juro que você se surpreenderia, pois nunca, fico a imaginar, planejou ter em tua vida, um louco alguém que pudesse te desejar com tamanha intensidade como esta que fere os meus olhos já doentios.
Você é a real personificação de meu mais tenebroso pecado, é a fúria que rumina no estômago de Deus ao olhar pra mim e me ver ainda hoje tão pecador e sensível como nunca aos desejos saborosos de cair, se render, ou se deitar em tentação.
Hoje, naquela hora em que juntos estávamos, o que eu queria era te beijar, te possuir, te gritar pelas ruas como uma parte de mim, uma parte de meu prazer, de meu poder, de minha fraqueza. Eu queria poder te desejar e ter, e não apenas fantasiar em minha mente brilhante as idéias mais absurdas que poderíamos juntos fazer.
Eu estava acordado e de uma forma pouco diferente dos demais dias em que sonhava contigo e não te encontrava ao despertar.
Eu falava de minhas províncias e você das grandezas da cidade. Eu falava de minhas coragens e você dos impecílios de uma viagem perigosa, eu tinha minha mente ao encontro das nuvens, mas você os pés no chão e o coração sentado, à espera de um assento no mesmo restaurante que se encontrava cheio.
Nossa comida tinha sabores diferentes, cheiros destonados, e temperos variados pela intenção de ali estar.
A minha fome não era pelo cardápio de Frango à Parmegiana, poderia ser salada, pão seco ou suco das frutas mais variadas ou exóticas, como melancias, para estes teria um espírito anoréxico, pois a minha fome era de você, de tua companhia, de teu riso, piadas e tiradas, daquele olhar que por poucas vezes vi me encontrar num singelo e rápido olhar de uma direção pra outra.
Mas eram neste mesmo almoço que se revelava sutilmente o relógio que controlava nosso tempo, o teu, pois pra mim, tempo não existia, não valia de nada, queria poder congelá-lo com o mesmo gás que paralisava teu coração, ou tesão por mim.
O arroz não acabou, nem o feijão que você degustou com tanto prazer, porém teu apetite se foi, se satisfez. Eu perdi a vontade em comer.
Pedimos a conta, e agora, quem paga? Quem faria a gentileza da casa?
Dividimos. Você ficou com a maior parte, não tínhamos trocado, mas restava outro impasse. Quem vai pagar ao garçom?
Poderíamos chamá-lo e estaria tudo resolvido, mas na verdade tudo o que eu queria era não findar a tal conta, queria ficar um pouco mais, até às dez para às três, um pouco mais.
Talvez nem faça tanto sentido relatar aqui este impasse, mas não poderia perder sequer uma oportunidade de te dizer que era você que eu queria como almoço, perdão, alimento para meu real apetite. Você.
Você. Eu queria você para saciar o você que criei em mim em meus sonhares acordado. Você é do real tamanho do você que eu criei, mas com café, almoço, janta e ceia, claro que com sobremesa depois de cada uma destas.
Você me faminta e sacia, me entorpece e vicia. Você.
Enfim, pagamos a conta, fomos ao banheiro, um de cada vez, eu primeiro e logo você que até os dentes escovou, eu não levei a minha escova, sorte tua.
Saiu do banheiro e brincou comigo, mais olhei em outra direção, era a minha lógica, sabia qual era a brincadeira, se tivesse me feito criança pelo menos por aquele momento, eu veria os teus olhos a me encontrar e ensaiaríamos juntos um belo riso.
E então partimos, caminhamos, gargalhamos, nos despedimos.
Te olhei ao atravessar, re-olhei já atravessado, e retornei por assim fazer, totalmente atravessado da certeza que para você foi só mais uma almoço para teu apetite de feijão, arroz, frango e salada, satisfazer.

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