domingo, 25 de março de 2012

Eu sei fazer arroz

Foram quatro dentes médios de alho que descasquei como quem despe o corpo carregado dos pesos das horas do dia e se entrega abatido ao tempero da água quente que bate no lombo o frescor. Entre sais e óleos de canola seu corpo ia se corando tímido entre os constrangimentos de um primeiro encontro, mas o enlace era inevitável. Havia cheiro de entrega no ar e ele se espalhava feroz por todos os cômodos da casa.
Dizem os sabedores culinaristas que os opostos se atraem e culminam afrodicidades, mas era engano pensar que não havia um mundo de semelhanças entre as cinco xícaras de arroz que despejei sobre o tremor da panela que salpicava saliente no fogo, produzindo o dobro de água fria, agora em ebulição que em minha boca virgem despertava fome e saliva. E eu tinha que esperar o momento oportuno acontecer e se instaurar entre reboleios discretos e ousados. Entre números distintos e unidos entre seis e nove. Eu via fugas e retornos acontecerem. Ouvia as horas passarem sem passar, sem tocar, sem gemer. A hora se perdia entre o lençol branco de um arroz soltinho e saboroso que se torneava entre os grãos encharcados de delícias e sabor. Fogo alto se avolumava e então se abaixava sem som, pois a canção já avançara os meus ouvidos entre a tampa que permitia o seus pulos e vapor escorrer entre as bordas.
Pus o prato sobre a mesa e me deliciei entre arroz e feijão preto em minha cama. Comi. Me satisfiz e em poucos segundos era arroz puro e solado que eu queria outra vez, com dose tripla de feijão.

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