Tem dias que a alma desliga o som do mundo e a gente mergulha na imensidão dos sentimentos, onde só se escuta o eco gélido do que nos falta. Ou do que nos sobra no amargor do deserto.
A cama vira abrigo, prisão e cemitério de planos. Tantos planos! O celular toca e eu deixo morrer no toque. Sem me tocar de compor uma melodia de desculpas e com todas as culpas no pesar. Hoje não. Hoje não dá para inventar um vento fresco para não me espalhar aos olhares.
A ansiedade é um grito com cara de urgência — mas que corre em círculos dentro do peito, criando caminhos infindos e obscuros como uma furadeira, que martela violenta, sambando a tristeza sobre a superfície de uma parede da casa velha arquitetada entre muita mistura de cimento e barro. Ela me convence de que tudo vai dar errado e sem pestanejar tudo vira pó sobre o mão e meus pés descalços, calejados e rabiscados de tantos outros suspiros de proceder.
Lenta, vem depois, as percepções da urgência do respiro, como quem fecha as cortinas do palco e diz: acabou a peça, acabou você. Sem pausa. Sem segundo ato. Sem desfecho feliz. Breu.
Risco fósforos no escuro. Arrisco iluminar o rosto e encarar a dor. Caro é prosseguir o risco de continuar.
Dois fósforos. Três. Quatro. Um por vez. Alguns apagam, outros queimam o dedo. Mas às vezes... um ilumina o quarto todo. E o medo se revela inquilino sem inadimplência.
Tem noites que eu negocio com Deus, com o caos, com o travesseiro. Esqueço que sou péssimo no precificar.
Vai passar, mesmo que devagar, vai passar.
A gente acha que coragem é levantar bandeira, mas às vezes é só conseguir levantar da cama. É tomar banho depois de três dias e sentir que a água não lava tudo, mas pelo menos desperta alguma coisa. Há alguma coisa ainda em mim.
É mandar mensagem pra alguém, mesmo sem saber o que dizer.
É não se punir por não ser forte o tempo todo. E sambar com aquele vento mórbido que inventei.
Tem dias que ainda escurece por dentro. Tem dias que chove por dentro. Tem dias que o sol é inverno em pleno verão. E poucos verão.
Meu riso esforçado é crônica leal de meu viver. Eu que tropeço no próprio medo.
Dizem que existe um tipo de flor que nasce no meio do entulho. Será? Sinto em minha respiração o odor dos entulhos que guardo banhados em alfazema.
Quem me dera ser flor, e mesmo com galhos tortos, ou seca, refém dos giros das estações, resistir crescendo, embora hoje não sorrindo, quem sabe um amanhecer, florindo.
Dizem que viver é estar em paz com as estações e sob o pó da solidão de si um carnaval desfilar.
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