Tenho medo de admitir, mas quase tudo o que faço é por carência.
Por esse buraco invisível que se abre quando o dia termina e o silêncio começa a me escutar entre as nuvens que se abrem entre a cobertura da ponte. Sou movido por uma fome que não é de comida, nem de amor; é de prova. Prova de que existo para alguém, ainda que por descuido, ainda que por dó. Em tonalidade baixa de ré.
Aceito migalhas como quem recebe manjares. Um “oi” frio já me aquece. Um olhar distraído me alimenta por dias. E sigo, me enganando, achando que talvez tenha algum valor escondido nas entrelinhas dos que mal me notam. E de repente um " como foi teu dia?" que sempre esperei contar.
Sucumbo fácil aos pequenos gestos, mesmo quando não são gentis, mesmo quando só servem para manter-me no raio de alcance de quem não pretende ficar. Chamo isso de afeto, mas sei que é medo. Medo de não ser lembrado, de não ser necessário, de não ser sequer percebido. De ser apenas uma mecânica sedução sem gozo.
A carência é minha mais fiel companhia. Ela me dita as cartas, os textos, os olhares. Ela me convence de que amar, ainda que sozinho, é melhor do que desaparecer por completo.
E eu, crédulo, sigo obedecendo, pedindo desculpas por sentir demais, por esperar demais, por continuar esperando o que talvez nunca venha. Por vir por nós todos.
Sigo no prosseguir de em pró de nós reatar os nós do gosto ríspido do prosseco que abro para brindar-nos.
Um brinde ao conviver, partilhar, e ser um Zé nunca aberto ao ser.
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