domingo, 26 de abril de 2015

De roupa e sem mudo

Assim como se veste um defunto fresco e gelado
assim fui trocando minhas roupas claras
fui despindo o meu corpo dos cheiros das castanhas moídas
fui sepultando os paladares de teu hálito
esquecendo das texturas dos cravos de tua língua
cultuando o falecimento múltiplo de nossa paixão
eu via o mundo
você o ouvia
eu era cego
você...
ah, você era deficiência 
e então fomos parando
e pairando sobre nosso ar veio o cheiro das flores 
a sensação dos dias de Finados nos circulou
e foi ela a última graça que dividimos
sem jeito ficamos sem jeito
e o jeito foi fechar teus olhos
e dizer adeus
sem nada dizer
pois mudo também era eu
eu que sempre mudo
de roupa


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