"Não sou o último romântico, mas faço questão de ser o primeiro a ecoar as rimas dos poetas que conclamam o amor.
Somos cínicos e melindrosos quando a pauta é a exposição de nós. Caminhamos receosos no ruído inicial de uma entrega e nos reservamos calados em nossos medos.
Nunca houve uma sociedade onde ser forte fosse tão propagado, exigido e cultuado. Efêmeras projeções de perfeição. Proclamamos a independência de nossos sentidos e nada sentimos. Somos sequenciais ressentimentos sem cura."
Essas eram as palavras que ecoavam em sua mente vasta enquanto Lulu Santos cantava "O último romântico", logo após as poesias de Cazuza. E isso não houvera sido combinado. Mas uma vez a vida se divertia rindo das peripécias que pregava para o coroar tolo da corte que o cortava friamente o sorriso da calma.
A casa, como de costume, seguia vazia. No sofá cor-de-alguma-pele repousava o seu corpo cansado de nada fazer e refeito de todas as sensações que inspirara gozar. La petite mort o sepultou sozinho, refém de sua mão.
Seus movimentos eram arcaicos, frígidos, doloridos. Sua voz, desculpa para um abraço. Seu olhar, reclamações de um cuidado que esperava receber na cumplicidade de ser acolhido ou, de fato, amado.
Nas paredes da sala pequena rasuras de promessas não cumpridas confundiam a esperança de que o minuto passado poderia reviver e cada frustração ser projeções únicas de seus medos.
Não se enganem, nessa vida o que te cabe é a responsabilidade de si, mas você nunca será pureza de quem é. O mundo vai mentir pra ti e de ti tirar a castidade do suspirar.
Ele soluçou vivaz. Seguiu-se desmontando num suspiro seco. Em sua face o que ficou foi a poeira da exposição de si. E Lulu nem cantava mais.
Cada um sabe da dor de si. Cada um procura a metade que perdeu ou o quarto que lhe restou feito o inquilino educado, doce e discreto. Ao outro o que cabe é o ferir.
O que é o homem senão o dom de iludir?
Ou o que é a ilusão senão uma puta que em pequenas mortes nos vela a cura?